terça-feira, 11 de janeiro de 2011

A cidade submersa


Tudo começou como ideia de criança. Muitas vezes estivera em partes altas da cidade, para soltar pipa, e lá de cima a cidade parecia enfiada num buraco. Toda cercada pelas montanhazinhas verdes. Era simpática. Mas ele imaginava como seria inundar tudo aquilo. Transformar numa grande represa. Nem daria muito trabalho, a cabeça de menino dele pensava. Em suas brincadeiras, com carrinhos e cavalinhos, várias vezes transformou em realidade sua grande obra. 

E o menino cresceu. Viajou bastante, conheceu cidades e até outros países. Na força dos seus vinte e poucos anos ainda tinha aquela ideiazinha na cabeça. Mas quando ele falava disso, parecia mais piada do que qualquer outra coisa. Desde menino ele tinha aquele jeito palhaço de contar histórias e fazer todo mundo rir, embora isso agora fosse só de vez em quando e de preferência com público, porque na maioria do tempo ele tinha aquela cara amarrada e que, apesar de muito bonito, podia desencorajar qualquer tentativa de aproximação. Ele dizia que seria uma cidade no fundo da água, que se poderia mergulhar e ver tudo como era, principalmente a igreja iluminada, que sem saber bem como, ele pretendia que continuasse iluminada. As pessoas, que ouviam a história pela primeira vez, riam e achavam graça da imaginação dele. Os de casa, que a conheciam desde que ele era menino e corria atrás de borboletas e marimbondos, achavam graça dele não esquecer aquela ideia extravagante. 

Um dia o menino ficou velho. Mas nessa época ele já tinha juntado muito dinheiro. Ele sempre falava em ganhar em algum jogo da loteria federal, mas o que aconteceu mesmo foi que ele trabalhou muito. Por um bom tempo ele parecia ter esquecido aquela fantasia de criança de uma cidade submersa. Nesse tempo a cidade estava cercada por várias pequenas represas. Ele gostava de visitar esses lugares e lá ficava horas e horas olhando aquele tanto de água. Ele aprendeu nadar quando tinha uns 5 ou 6 anos. Ia para a piscina sozinho e voltava animado dizendo que tinha uns amigos que o estavam ensinando a nadar. Um dia a mãe, depois de muita insistência dele, foi até a piscina, num domingo ensolarado, cheio de grito de criança e cheiro de cloro. E ele atravessou a piscina grande, e todo orgulhoso veio sorrindo para a mãe que estava sem fôlego, como se fosse ela que tivesse acabado de atravessar toda aquela água azul.

Mas um dia ele fez o que tanto queria. Encheu de água toda a parte central da cidade. E foi mais fácil do que ele pensava. Ele passava horas e horas admirando. Estava ali, bem diante dos seus olhos. Parecia um aquário, mas não tinha nenhum peixe. Eram só casinhas, ruas, praças e, claro, a igreja iluminada. Não demorou muito e a impressa descobriu e virou uma atração turística, do jeito que ele sempre tinha sonhado. Com hora marcada para mergulho e tudo. A maquete era uma perfeição só. Apenas um de cada vez podia entrar na cidade submersa. O velho e o menino juntos observavam o sonho e a realidade e sorriam, satisfeitos.

Nenhum comentário:

Sobre o que se fala

cotidiano Poesia Dicas opinião opiniões política utilidade pública atualidade atualidades Rapidinhas Campinas educação Conto crônica Minas Gerais São Paulo cinema observações Brasil coisas da vida escola Misto música Delfim Moreira divulgação Barão Geraldo Bolsonaro Literatura democracia eleições Filosofia da vida leitura coisas que fazem bem passeios Comilança clã Bolsonaro redes sociais revoltas amigos coronavírus debate público ensino paixão preconceito; atualidades sobre fake news séries Dark Futebol amor coisas de mineiro coisas do mundo internético criança do eu profundo façamos poesia; final de ano; início de ano; cotidiano; pandemia 8 de março Ciência de irmã pra irmã distopia história infância lembranças mulheres política; tecnologia virada cultural Violência; Educação; utilidade pública autoritarismo comunicação consumo consciente desabafo economia fascismo férias impressa manifestação mau humor mentira mágica pós-verdade quarentena racismo estrutural reforma da previdência ser professor (a) sobre a vida música Poesia 15 de outubro 20 de novembro 2021 Anima Mundi EaD Eliane Brum Fora Bolsonaro Itajubá Moro Oscar Passarinho; Poesia; Vida Posto Ipiranga aborto adolescência amizade amor felino animação; assédio sexual autoverdade balbúrdia baleia azul. bolsonarismo cabeça de planilha consciência negra corrupção coti covid-19 crime curta; crônica; curtas; concurso; festival curtas curtas; crônica; da vida; defesa democracia liberal descobrindo o racismo desinformação direitos discurso divulgação; atualidades divulgação; blogs; poesia documentário família filosofia de jardim fim das sacolinhas plásticas frio férias; viagens; da vida; gata guerra de narrativas hipocrisia humor ideologia jornalismo lei de cotas livros minorias morte mídia música Poesia novidades para rir próxima vida racismo institucional rap resenha; atualidade; interesse público; educação saudade sentimentos tirinhas universidade utopia verdade verdade factual viagem violência

Amigos do Mineireces