sexta-feira, 29 de novembro de 2019

A verdade de Bolsonaro e o fim da política

"Conhecereis a verdade e a verdade vos libertará" - o jargão de Bolsonaro, a única coisa que ele leu na Bíblia. Se é que ele leu. É mais provável que tenha ouvido de alguém, de algum dos seus amigos pseudo-cristãos ou cristãos-fakes.  Mas que 'verdade' seria essa? A 'verdade' do texto bíblico teria algo a acrescentar ao debate político? Quando Bolsonaro recorre ao versículo de João para acusar a imprensa de mentir, que 'verdade' exatamente ele quer que a imprensa anuncie? 

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Alguém poderia pensar: uai, verdade é verdade, o presidente está só exigindo que a imprensa (a Folha de São Paulo, para ser mais específico) fale a verdade. Mas não é tão simples assim. Um conceito como o de verdade é bastante complexo, pode ter diferentes sentidos e aplicações. 

Quando um profeta ou um religioso diz que tem a verdade, ele acredita ter recebido essa verdade de alguma divindade ou ser superior, que normalmente está fora do mundo. Ele acredita ter falado com essa divindade pessoalmente ou ter sido inspirado por ela, ou ter recebido uma mensagem de um anjo ou de uma voz misteriosa vinda do além. A verdade da Bíblia e todas as outras verdades que estão associadas a alguma religião costumam ter o caráter de verdade revelada. Ou seja, ela é revelada por algum ser superior (deus, espírito, anjo, santo, demônio, etc). Quando aquele que teve acesso a tal verdade a anuncia, ele espera que aqueles que o escutam acreditem na sua palavra, no seu testemunho, e também acreditem na origem divina da mensagem que ele traz. Ou seja, não há como comprovar essa verdade, ela é objeto de fé. Quando um matemático afirma que 'é verdade que dois mais dois são quatro', estamos diante de uma verdade racional. Também as verdades filosóficas e científicas em geral poderiam ser enquadradas nessa categoria e seriam resultado da mente humana. Portanto, diferente das verdades reveladas, que estariam prontas em algum lugar e seriam apresentadas ao homem por meio de uma divindade, a verdade racional seria construída pela mente humana. Por fim, quando dizemos que em 1º de abril de 1964 houve um golpe militar no Brasil, estamos lidando com uma verdade factual. Segundo Eugênio Bucci, 

"a verdade factual é um buraco no meio da rua, uma criança sentada num banco de escola, a dor no joelho, a fome que devora a esperança das famílias sem dinheiro, a alegria de pessoas que se amam andando de mãos dadas num parque público ensolarado. A verdade factual é aquilo que conforma a realidade sensível e sobre a qual não pairam dúvidas práticas." (BUCCI, 2019, p.85).

A verdade revelada é imutável e independe de qualquer ocorrência no mundo, uma vez que sua origem não é esse mundo. Portanto, ela se impõe de cima para baixo, de fora para dentro, pelo mistério ou pela autoridade. A verdade racional, por ser uma construção da mente, também se impõe para todo aquele que estiver disposto a seguir os caminhos da razão. Já a verdade factual parece, num primeiro momento, não gozar da mesma força coerciva dos demais tipos de verdade, pois ela depende dos fatos, e os fatos são contingentes, acidentais, poderiam ser de infinitas outras maneiras, ou simplesmente não ser. No entanto, uma vez que este fato ocorreu, sua verdade factual torna-se imperativa e só mesmo a mentira tem força para fazer frente a ela. Segundo a filósofa Hannah Arendt, 

"Asserções como "Os três ângulos de um triângulo são iguais aos dois ângulos de um quadrado", "A terra move-se em torno do sol", "É melhor sofrer o mal do que praticar o mal", "Em agosto de 1919 a Alemanha invadiu a Bélgica" diferem muito na maneira como se chegou a elas, porém, uma vez percebidas como verdadeiras e declaradas como tal, elas possuem em comum o fato de estarem além de acordo, disputa, opinião ou consentimento. Para aqueles que as aceitaram, elas não são alteradas por multidões ou pela ausência de multidões que acolham a mesma proposição; a persuasão ou dissuasão é inútil, pois o conteúdo da asserção não é de natureza persuasiva, mas sim coerciva (ARENDT, 2016, p.297).

Essa característica da verdade estaria na origem do conflito antiquíssimo entre verdade e política, ou talvez, de maneira mais precisa, do conflito entre verdade e políticos. Os políticos, aqueles que estão em posição de poder, e mais ainda os políticos com tendências autoritárias, sempre se sentiram ameaçados pelo caráter despótico da verdade. De acordo com Arendt,

"Ela é, portanto, odiada por tiranos, que temem com razão a competição de uma força coerciva que não podem monopolizar, e desfruta de um estado um tanto precário aos olhos de governos que se assentam sobre o consentimento e abominam coerção" (ARENDT, 2016, p.298). 

Bolsonaro é um político, embora tenha sido eleito com o discurso da antipolítica. Ele não é um líder religioso, nem um cientista, nem filósofo, é um político. E o tecido da política são os fatos. É a verdade factual que encorpa a política. Mas em onze meses de governo, Bolsonaro, que nunca teve apreço pela democracia, tem deixado patente seu desprezo pelos fatos e seus ímpetos autoritários. Portanto, ele faz parte do grupo de políticos que, segundo Arendt, odeia a verdade. 

Agora volto às minhas perguntas iniciais e as reformulo: Quando Bolsonaro insiste no versículo bíblico, "conhecereis a verdade e a verdade vos libertará", a que verdade ele se refere? À verdade factual? À verdade racional? Ou seria à verdade revelada? Uma primeira hipótese é que a verdade de Bolsonaro seria uma espécie de verdade revelada, tal qual aquela da Bíblia. Assim como lemos na Bíblia que "Jesus é o caminho, a verdade e a vida", Bolsonaro parece pretender se apresentar como a verdade. A verdade de Bolsonaro, anunciada por ele mesmo, não admite provas, não pode ser verificada, ela se impõe pela autoridade, do cargo ou de Deus - com quem Bolsonaro parece acreditar ter uma relação muito direta. Essa hipótese ganha força quando encontramos ao lado de Bolsonaro cristãos-fakes dispostos a transformar Messias, o Jair, em um enviado de Deus e assim em ungi-lo diante das massas de fiéis. 

Mas pode ser que a verdade de Bolsonaro seja só mesmo uma mentira. Nesse caso, para entender a insistência de Jair com o versículo de João, é preciso recorrer à literatura. Com 1984 aprendemos que guerra é paz, liberdade é escravidão e ignorância é força. Cada vez que Bolsonaro recorre à verdade,  ele nos oferece em seu lugar uma mentira. Assim, poderíamos acrescentar à lista de 1984 que mentira é verdade.

Bolsonaro ao dizer "conhecereis a verdade e a verdade vos libertará" pretende que a sua verdade nos liberte do quê? Do comunismo petista que domina inclusive a imprensa internacional? Da ideologia de gênero que quer transformar todas as crianças em gay? Do globalismo? Do politicamente correto? Da ditadura gay que nos oprime? Cada uma dessas ameaças não passam de pedaços de uma super teoria da conspiração que hoje dita os rumos da política no Brasil. Para entender melhor como essa super teoria da conspiração está atuando no cenário brasileiro recomendo a leitura de Tudo o que você precisou desaprender para virar um idiota, do Meteoro Brasil

O que me interessa aqui é mostrar que a verdade de Bolsonaro não passa de uma verdade-fake. Ou seja, Bolsonaro nos conta mentiras, afirma que estamos ameaçados por uma dúzia de espantalhos criados justamente para causar pânico. Ele - mas não só, há minions pela internet, cristãos-fakes, filósofos-fakes, jornalistas-fakes - convenceu uma boa parte dos brasileiros - e outra parte fez de conta que estava convencida porque tinha outros interesses - de que todas aquelas teorias conspiratórias eram verdade. Ou seja, a mentira virou verdade. Depois ele disse que era preciso mudar tudo isso que estava aí. 

Mas a verdade de Bolsonaro é fake. E cada vez que suas mentiras são denunciadas, ele ataca e grita que só a verdade poderá nos libertar. Ele ameaça, boicota, censura. Mas diz que o resultado de tudo isso é mais democracia. Bolsonaro é perverso, como já explicou Eliane Brum. Foi ela também que nos explicou que Bolsonaro opera com a autoverdade, "algo que pode ser entendido como a valorização de uma verdade pessoal e autoproclamada, uma verdade do indivíduo, uma verdade determinada pelo “dizer tudo” da internet" (BRUM, El país,  julho de 2018). Esse 'dizer tudo' é performático e pretende criar uma nova realidade. Hannah Arendt já havia chamado a atenção para o fato de que o mentiroso é um sujeito de ação. O mentiroso deseja mudar a realidade. Mentirosos como Bolsonaro, e sua inspiração estadunidense, criam seus próprios fatos, fatos alternativos, como chegou a declarar uma conselheira da Casa Branca. 

O perigo de tudo isso é que, sem os fatos, não é possível a política. Sem os fatos e a verdade factual nos restam os caprichos dos tiranos. Como disse Bucci, "a política sem fatos é um delírio apolítico ou antipolítico, uma guerra entre convicções desprovida de verdade" (BUCCI, 2019, p.83). 

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ARENDT, Hannah, Verdade e política, in Entre o passado e o futuro, São Paulo: Perspectiva, 2016.
BRUM, Eliane, Cem dias sob o domínio dos perversos, in El País Brasil, disponível em: https://epoca.globo.com/politica/eugenio-bucci/noticia/2017/01/o-adeus-aos-fatos-e-o-totalitarismo.html. 
BRUM, Eliane, Bolsonaro e a autoverdade, in El País Brasil, disponível em:https://epoca.globo.com/politica/eugenio-bucci/noticia/2017/01/o-adeus-aos-fatos-e-o-totalitarismo.html.
BUCCI, Eugênio, Existe democracia sem verdade factual?, Barueri,SP: Estação das Letras e Cores, 2019.
BUCCI, Eugênio,  O adeus aos fatos e o totalitarismo, in Revista Época, disponível em: https://epoca.globo.com/politica/eugenio-bucci/noticia/2017/01/o-adeus-aos-fatos-e-o-totalitarismo.html.
METEORO BRASIL, Tudo o que você precisou desaprender para virar um idiota, São Paulo: Planeta, 2019.


quarta-feira, 20 de novembro de 2019

Descobrindo o racismo

Resultado de imagem para Cirilo e maria joaquina anos 90
Cirilo - primeira versão do Carrossel exibida no Brasil em 1991
Como a maioria das pessoas nesse país, cresci num ambiente racista. Tanto o ambiente familiar quanto o ambiente expandido. Ouvi tantas  'piadas" sobre cabelo de negro, sobre serviço de preto, ou coisa de preto. Por algum motivo, eu não nunca aceitei isso como normal. Lembro que desde pequena brigava com quem dizia essas coisas. Lembro de ter chorado algumas vezes, quando criança, porque meus tios faziam esse tipo de comentário. E o meu choro era ainda motivo para meus tios dizerem que eu ia casar com um preto, como se isso fosse algo ruim ou engraçado.

Mas na minha memória, meu primeiro contato com o racismo e com o preconceito de classe, ficou registrado de maneira muito forte. Eu tinha uns seis anos. Estava na escolinha. Eu era uma criança chata, não gostava de brincar e na hora do recreio, ficava perto dos adultos, das professoras, no caso, conversando. Num desses dias, a filha de uma professora, que também estudava na escolinha e era um ano mais nova do que eu, chegou do meu lado e disse: "sai de perto da minha mãe, você parece o Cirilo". Eu fiquei muito triste. Eu chorei. Para quem foi criança nos anos 90, sabe que o Cirilo era o menininho negro da novelinha infantil, Carrossel. O menino negro e pobre que era constantemente humilhado pela menininha branca e metida, Maria Joaquina. Quando a filha da professora me disse aquilo, eu sabia que ela queria me xingar, me ofender. Eu não era negra - inclusive o tom de pele da filha da professora não era nada diferente do meu -, mas eu era pobre. E mesmo com seis anos, eu tinha alguma noção de que eu, de algum modo, era parecida com o Cirilo. E aquilo me doeu. 

Em vários momentos da minha vida eu me lembrei dessa cena. Certamente eu a fantasiei e a reconstrui de muitos modos. Mas toda vez que eu lembro dela, sinto que desde muito cedo eu entendi que algumas pessoas achavam que a cor de outra pessoa era motivo para ela valer menos, ou para que ela tivesse que sofrer. Lembro que assistindo a novelinha infantil, eu chorei muitas vezes com as maldades da Maria Joaquina. Mas eu também sentia raiva do Cirilo, porque ele sempre dizia: "eu só quis ajudar". Porque diante das respostas mal criadas da menina loira, ele continuava gostando dela, querendo estar perto dela. Lembro do episódio que ele passa uma pasta branca na cara, pra ver se ficava branco. Aquilo era tão cruel. Outra cena que me marcou muito foi a do pai da Maria Joaquina, se não estou enganada, chorando diante do reconhecimento da maldade e do preconceito da filha. A verdade é que com o Carrossel e com a filha da professora me chamando de Cirilo, eu aprendi o que era racismo. 

Mesmo sabendo de tudo isso e mesmo me incomodando muito com as falas racistas que sempre fizeram parte do meu mundo, eu levei muito tempo para entender a profundidade do racismo e porque as cotas - para o ensino superior- eram necessárias num país como o nosso. Eu só fui entender de verdade, entender não de maneira racional, mas de maneira afetiva e emocional, quando comecei a dar aula. Quando ouvi uma professora dizendo que um dos meus alunos, que era negro, não passaria de caixa de supermercado, e que não tinha muito o que fazer por ele, 'tadinho'. Foi aí que eu entendi o que era racismo estrutural e institucional. Eu nem conhecia essas expressões. Mas entendi que quando uma criança ou adolescente tem o seu futuro predeterminado por causa da dor da sua pele, ele está numa desvantagem imensa em relação a seu colega que é branco, ainda que esteja ali, na mesma sala de aula, com os mesmos professores. 

O racismo no Brasil na maior parte do tempo tem sido velado, tem sido suavizado por comentários carregados ora do tom da 'brincadeira', ora do tom da caridade. O negro no Brasil só cabe em dois papeis: ou é malandro ou é o coitado. Se é malandro, tem que ser preso mesmo, tem que morrer, tem que pagar seja pelo que é tenha feito - por existir? Se é coitado, está lá para que algum branco de bom coração possa fazer sua caridade, sua doação, sua boa ação, do dia ou do ano. Infelizmente, no Brasil de 2019, o racismo está cada dia mais escancarado, e até encontra deputado disposto a quebrar obra de arte que discute o racismo  e o genocídio da população negra e deputado pra defender a atitude boçal e criminosa do coleguinha. 

Eu descobri o racismo muito cedo. Mas acredito que fiz muito pouco até hoje para combatê-lo. E é uma tarefa que deveria ser abraçada por todos. E começa por não rir de 'piada' sem graça, do tio ou seja lá de quem for. Por não fingir que o racismo não existe, só porque é mais cômodo. Aguçar nosso olhar para ver o racismo que nos cerca diariamente, ou que segrega as pessoas nas grandes cidades todos os dias. Da próxima vez que for a um shopping, procure enxergar as pessoas negras nesse espaço. Da próxima vez que for a um restaurante, se pergunte por que não tem negros sentados ao seu lado ou quando for ao médico ou procurar um advogado. A primeira coisa urgente a ser feita é romper com a nossa cegueira social. 

Nesse dia 20 de novembro, convido a todos a olharem e enxergarem o mundo com as cores que ele tem ou não tem em determinados lugares. Mas é preciso cuidado para não ser emburrecido por comentários como o do deputado que disse: ao entrar na favela nós vemos a maioria de negros com armas, e isso é um fato. Para não sairmos acreditando que os negros escolheram estar na favela, escolheram a marginalidade, escolheram ser pobres, escolheram ser faxineiros, porteiros, diaristas, seguranças. Que os negros escolheram que não querem ser médicos, advogados, professores, engenheiros, músicos, poetas, atores, juízes, presidente da república, senador ou deputado. Os fatos estão aí, e precisam ser interpretados. Nunca é tarde para nos perguntarmos por que é assim. Nunca é tarde para reconhecermos o que 300 anos de escravidão fizeram com o povo negro no nosso país. Nunca é tarde para reconhecermos que houve uma política de branqueamento da população e um esforço oficial de apagamento do povo negro e de sua história.



segunda-feira, 4 de novembro de 2019

Quando o Posto Ipiranga virou ministro da economia do Brasil

"Um menino, desde cedo, sabe que ele é um ser de responsabilidade quando tem de poupar. Os ricos capitalizam seus recursos. Os pobres consomem tudo" (Paulo Guedes - ministro da economia- Congresso em Foco)

Três afirmações, mas tem tanta coisa errada aí que é difícil até começar. Mas comecemos pelo machismo: "um menino, desde cedo, sabe que ele é um ser de responsabilidade quando tem de poupar". Na cabeça do Posto Ipiranga de Bolsonaro, responsabilidade é coisa de menino, assim como, "todo brasileiro é apaixonado por carro". Mas o menino só sabe que é um ser de responsabilidade quando poupa. Os outros meninos, que não poupam, seriam irresponsáveis? Como as meninas? Ou será que aí já não é mais uma questão de gênero, e sim de classe? Afinal, para o chicago boy transvestido de ministro, "Os ricos capitalizam seus recursos. Os pobres consomem tudo".

Segundo alguns dicionários, uma das definições de pobre é desprovido de recursos próprios. Nesse caso, o que exatamente  seria o "tudo" que os pobres consomem, segundo Guedes? Esse "tudo" de que fala o Posto Ipiranga seria o salário - quando o pobre tem emprego? Um salário de R$ 998,00? Realmente esses pobres são uns irresponsáveis! Como não são capazes de poupar seus recursos? Ou ainda de capitalizar seus recursos?

Que os ricos capitalizem seus recursos é algo bastante compreensível (e esperado), mas que os desprovidos de recursos o façam, para mim é uma questão de mágica. Será que o Posto Ipiranga agora também é mágico? E estaria disposto a 'compartilhar' seus truques para poupar quando se ganha R$ 998,00? Vejamos, nem precisa ser tão pobre assim, vamos pensar num pobre que receba R$ 1500,00, tem uma família com três pessoas - o ser de responsabilidade, a esposa (um ser sem responsabilidades, que portanto, não trabalha nem poupa) e um filho -, morando numa cidade como Campinas, pagando aluguel (média de 800,00), água, luz, transporte, alimentação... Quais das despesas básicas o ser de responsabilidade deveria deixar de pagar para poupar? E se deixasse de pagar, ainda seria um ser de responsabilidade, na concepção do Guedes?

Se a declaração de Paulo Guedes não é exemplo de pura e completa perversidade (bem ao estilo do ex-ministro chileno que mandou a população acordar mais cedo para pagar mais barato pelo metrô), não sei o que é. Não é possível que ele não tenha nenhum conhecimento da realidade do país. Pensando bem, é possível sim, é bem possível. Afinal, ele caiu de paraquedas no setor público, nunca se interessou por números que não fossem os do setor financeiro. E quando se trata de números, estatísticas e dados sobre a população brasileira, se perguntar demais a gente descobre coisa que não queria saber. Suas declarações, assim como suas intenções de reformas, são provas contundentes da sua incapacidade para estar onde está. Mas também são demonstrações do desprezo que uma certa elite brasileira sempre teve em relação aos pobres. Mas agora, nesse Brasil de Bolsonaros e Postos Ipirangas, esse desprezo se tornou política pública, e o escárnio é escancarado.

Se o Congresso Nacional, capitaneado por Rodrigo Maia e Davi Alcolumbre, referendar as propostas de deforma tributária que os cabeças-de-planilha estão arquitetando - com previsão de aumento de tributação sobre rendimento da poupança, cesta básica, remédios, rescisão trabalhista e muito mais -, nós veremos o Brasil disparar rumo a miséria. Se tudo der certo - tudo que o Posto Ipiranga prometeu fazer: privatizar tudo, reforma tributária, reforma administrativa - os pobres e parte da classe média vão se f.... de verde e amarelo, e graças a irresponsabilidade típica dessa gente, não vão poupar nada. Já Guedes, sua família e todos os outros seres de responsabilidades vão continuar capitalizando seus recursos (ou seria os recursos saqueados dos pobres?...).

Quem dera os pobres não poupassem indignação com esse desgoverno. Quem dera não poupassem revolta contra o escárnio do Posto Ipiranga. Quem dera não poupassem esforços para imitar nossos vizinhos chilenos. Por enquanto estamos apenas fazendo reserva, não vejo a hora de transbordar...





domingo, 3 de novembro de 2019

Sobre imunidade parlamentar e os abusos do clã Bolsonaro

Tal pai: 
"Pela memória do coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, o pavor de Dilma Rousseff, pelo exército de Caxias, pelas Forças Armadas, pelo Brasil acima de tudo e por Deus acima de tudo, o meu voto é sim" (Jair Bolsonaro - 18/04/2016)

Tal filho:
"Vai chegar um momento em que a situação vai ser igual a do final dos anos 60 no Brasil, quando sequestravam aeronaves, quando executavam-se e sequestravam-se grandes autoridades, cônsules, embaixadores, execução de policiais, de militares. Se a esquerda radicalizar a esse ponto, a gente vai precisar ter uma resposta. E a resposta pode ser via um novo AI-5, via uma legislação aprovada através de um plebiscito, como aconteceu na Itália. Alguma resposta vai ter que ser dada" (Eduardo Bolsonaro - 28/10/2019)

Em 2016, o Congresso Nacional foi covarde e irresponsável diante da declaração criminosa de Jair Bolsonaro. Ele fez apologia à tortura e a um torturador e saiu de lá como se isso fosse a coisa mais natural do mundo. Em 2019, o Congresso Nacional cometerá o mesmo erro? Ou veremos o Congresso agir com independência e coragem? A cassação de Eduardo Bolsonaro seria uma prova de que ainda há deputados comprometidos com a democracia.

Diante da declaração de Eduardo Bolsonaro, deputado federal por São Paulo, muitos jornalistas e comentaristas dos principais meios de comunicação lembraram o que diz nossas leis sobre fazer apologia ao crime ou estimular atos de ruptura institucional. Vejamos o que diz a Constituição Federal: 
Art. 5º – Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
XLIV – constitui crime inafiançável e imprescritível a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático;
A Lei de Segurança Nacional (7.170/1983) é ainda mais clara:
Art. 22 – [É considerado crime] fazer, em público, propaganda:
I – de processos violentos ou ilegais para alteração da ordem política ou social;
Pena: detenção, de 1 a 4 anos.
§ 1º – A pena é aumentada de um terço quando a propaganda for feita em local de trabalho ou por meio de rádio ou televisão.
§ 2º – Sujeita-se à mesma pena quem distribui ou redistribui.
Art. 23 – Incitar:
I – à subversão da ordem política ou social;
II – à animosidade entre as Forças Armadas ou entre estas e as classes sociais ou as instituições civis;
III – à luta com violência entre as classes sociais;
IV – à prática de qualquer dos crimes previstos nesta Lei.
Pena: reclusão, de 1 a 4 anos.
Além disso, o Código Penal (Decreto-Lei 2.848/1940) em seu artigo 286 assim reza: "Incitar, publicamente, a prática de crime: Pena – detenção, de três a seis meses, ou multa."

Tanto o filho quanto o pai, diante da repercussão negativa de suas falas abjetas e desprezíveis,  recorreram à Imunidade Parlamentar para se esquivarem de suas responsabilidades. Não é a primeira vez que um parlamentar tenta se esconder atrás dessa tal imunidade. Quando ouvimos suas justificativas, parece que Imunidade Parlamentar é salvaguarda para uma pessoa ser completamente idiota e dizer todo tipo de insulto, mentira, asneira e fazer apologia ao que há de pior no mundo e no ser humano. Mas será que é assim mesmo? O que é, de fato, Imunidade Parlamentar? Qual sua função?

Vejamos o que diz a Constituição Federal:
“Art. 53. Os Deputados e Senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos”. O artigo 53 claramente diz respeito a situações diretamente ligadas ao exercício do mandato, tendo em vista a preservação do parlamentar, protegendo-os contra abusos e violações por parte do poder executivo e do judiciário. No entanto, é mesma Constituição que em seu artigo 55 prevê a perda do mandato, caso as atitudes do parlamentar sejam incompatíveis com o decoro parlamentar. E esclarece: "É incompatível com o decoro parlamentar, além dos casos definidos no regimento interno, o abuso das prerrogativas asseguradas a membro do Congresso Nacional ou a percepção de vantagens indevidas."

Mas o que seria considerado abuso das prerrogativas? Um deputado eleito pelo voto popular insinuar numa entrevista, portanto, fora das atividades intrínsecas do cargo, fechar o congresso nacional seria ou não um abuso das suas prerrogativas? Um deputado eleito, dentro do Congresso, defender um torturador e as práticas de tortura, quando o estado de direito condena tais práticas, seria ou não um abuso das suas prerrogativas? O processo de cassação de Eduardo Bolsonaro pode ser, como seu irmão Flávio (aquele que ainda nos deve explicações sobre o Queiroz) e seu pai-presidente se adiantaram para classificar, entendido como 'perseguição política'? Ou estaria o clã Bolsonaro querendo artificialmente criar sua própria versão do paradoxo da tolerância segundo o qual a tolerância ilimitada levaria ao desaparecimento da tolerância? No caso do clã, as prerrogativas democráticas ilimitadas levariam ao desaparecimento da própria democracia.

Se o Congresso Nacional se deixar levar pelas escusas do clã Bolsonaro,  poderá dar o golpe de misericórdia na já muito debilitada democracia brasileira. O primeiro golpe foi no dia 18/04/2016 quando permitiu que Bolsonaro-pai saísse do Plenário como se não tivesse feito nada demais. Rodrigo Maia terá coragem para se afirmar como alguém capaz de manter o Congresso em linha com a Constituição Federal ou se mostrará mais um oportunista disposto a rifar a democracia?

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