segunda-feira, 18 de fevereiro de 2008

A colheita

O décimo quinto raio de Zubuê atravessou a décima quinta fresta do muro sagrado. Era a estrela, antes havia uma sequência de figuras geométricas: quadrados, triângulos e círculos, mas o primeiro e o último dos símbolos era a estrela de cinco pontas. Era hora de começar a marcha. Estavam lá com suas vestes escuras, todos com o rosto coberto. O Templo os esperava. A deusa sempre guardava surpresas para aquela comemoração. Dois dias de celebrações e depois começaria a colheita. Por debaixo das túnicas escuras elas traziam vestes coloridas e enfeites pelo corpo todo: colares e pulseiras com sementes da plantação. Eles tinham o corpo pintado de vermelho. No rosto todos tinham um estrela de cinco pontas, na testa, pintada de amarelo. A deusa Kaiemá era esposa de Zubuiê, que agora espalha seus raios através daquelas figuras no muro sagrado, avisando que chegou a hora de se colocarem em marcha. Entre as duas estrela, começo e fim, estava o caminho percorrido pelos antepassados.

A marcha era silenciosa. Mas era ritmada: todos andavam na mesma direção como se estivessem em fila. Os pés se levantavam juntos e tocavam as areias também juntos. Nas mãos, elas seguravam fios coloridos embolotados. Eles traziam um pedaço de madeira. Os pequenos não acompanhavam aquela caminhada. O chá azul que eles tomaram na noite anterior os faria dormir até que a colheita terminasse.

No primeiro dia da colheita, Zubuiê chegaria antes e se recolheria mais tarde. Taioá, irmã de Zubuiê, ficava escondida por esse tempo. Assim eles descansavam profundamente durante a noite escura, para que a colheita rendesse.

O Templo estava iluminado. Os guardiões preparavam tudo. No centro estava o lugar do grande sacrifício. Durante a colheita seria separado tudo que ficará ali e, no último dia, será entregue à Kaiemá. As portas do Templo se fechariam e Kaiemá só voltaria na próxima colheita. As folhas sagradas queimavam em todos os cantos do Templo. Os mantos escuros já estavam no chão. O colorido dos tecidos e das tintas se misturavam com os raios de Zubuiê que entravam pelos quatro símbolos no teto. A fumaça aos poucos trazia ao centro do Templo os primeiros sinais de Kaiemá. Elas começaram a dança. Eles faziam a batida ritmada. Dois grandes círculos, girando em sentidos invertidos, se organizaram no interior do Templo. De repente, param e formam a estrela de cinco pontas.

Kaiemá surge no centro das estrela e seu brilho intenso deixa todos embriagados. Ela se curva em direção aos quatro cantos do Templo. Sopra a fumaça das folhas sagradas e a alma deles inspira. Seus corpos vazios caem no chão. Kaiemá passeia por entre os corpos caídos, e deixa sobre cada um uma nova semente. Antes de sair do Templo ela devolve as almas a seus corpos, num expiro longo.

Quando eles acordam ficam extasiados com as novas sementes. As folhas sagradas foram todas queimadas. As cinzas são recolhidas no centro, onde serão feitas as oferendas. Ao redor do Templo começa a dança da colheita. Quando Taioá chega eles dormem. Durante a noite Taioá desaparece. No meio da noite escura, Kaiemá volta para trazer o alimento e a bebida para o dia seguinte. Os primeiros raios de Zubuiê os faz despertar. Maravilhados, devoram tudo que Kaiemá trouxe durante o sono. Novamente entram no Templo, mais uma vez dançam até Kaiemá aparecer. Outras sementes foram deixadas pela deusa. Dessa vez, a irmã mais nova de Kaiemá vinha molhar a terra e deixava um perfume inebriante no ar. Kuraiá só voltaria quando a colheita tivesse chegado ao fim. Mais uma vez descansavam quando Taioá regressou. Como na noite anterior, Taioá desaparece durante a noite e Kaiemá vem trazer o alimento.

Quando Zubuiê vem despertá-los, devoram todo alimento e logo em seguida iniciam a marcha até a plantação. Voltariam ao Templo no fim do dia para entregar à Kaiemá o que lhe pertencia. Voltavam no mesmo ritmo silencioso. Os pequenos em breve estariam despertos. Os guardiões enviados por Kaiemá regressavam para o Templo. As portas seriam fechadas e as oferendas fariam Kaiemá descansar até a próxima marcha.

O trabalho agora era cuidar das novas sementes até a nova colheita...

08/10/2007

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