"Estamos mal porque o nosso ensino médio, voltado para o vestibular, reprova a metade dos alunos que nele conseguem entrar e os condena ao contingente do 'nem estuda nem trabalha'"(retirado de Por que a educação precisa mudar?, grifo meu).
O artigo do qual retirei a afirmação acima
é claramente anti-petista (e não estou aqui para defender o
pt ou qualquer outro partido, porque realmente não acredito que nenhum deles
mereça qualquer defesa quando o assunto é educação) mas acredito que por isso,
apesar de ser publicado num meio de comunicação do Estado de São Paulo, parece ignorar a situação calamitosa da educação
nesse estado há tantos anos conduzido pelo psdb. Mas isso é apenas uma
constatação, não pretendo tratar dessa questão, até porque o desgaste gerado
por essa polarização pt/psdb já deu o que tinha que dar.
A minha questão é bem pontual e diz
respeito ao que deixei grifado na citação, a saber, a afirmação de que o
'ensino médio brasileiro é voltado para o vestibular'. Se o João Batista
estivesse falando do ensino médio das escolas privadas, das redes Anglo,
Objetivo, COC, e por aí vai, eu estaria de acordo. No entanto, todo o texto
dele é focado em políticas públicas e em escolas públicas (ou eu estou
equivocada?), centrado em ações ou na falta delas por parte do governo federal.
Até onde eu sei, o maior contingente de alunos hoje está na rede pública e, por
outro lado, as escolas que ideologicamente têm o ensino médio voltado para o
vestibular são justamente aquelas que mais 'aprovam' seus jovens no vestibular
das melhores universidades públicas desse país. Perceberam o problema?
Desde o fim da década de 90, eu ainda
estava no ensino médio, tornou-se moda nas escolas públicas o discurso de que
esse segmento escolar deveria 'preparar o aluno para a vida' (e não para o
vestibular, subentende-se). Desde aquela época o meu questionamento era: e o
vestibular não irá fazer parte da vida do jovem egresso do ensino médio? Que a ‘vida’
do aluno do ensino médio não se resume ao vestibular estou de pleno acordo. Mas
daí a negar a existência do vestibular em nome de uma formação para a cidadania
ou seja lá que nome se dá para isso me parece um grande erro. Mas talvez esse
erro seja estratégico.
Como eu disse, esse discurso é comum nas escolas públicas. Hoje eu sou professora da rede estadual de São
Paulo, e posso garantir que o ensino médio dessa rede não é voltado para o vestibular. Na verdade passa a anos luz disso, ainda mais
se estivermos falando do vestibular das universidades públicas. Não sei se
estou sendo clara, mas essa negação do conteudismo
e da preparação para o vestibular só
se dá para os alunos de classe baixa, que são os freqüentadores das escolas
públicas. Os filhos da elite brasileira não
precisam ser preparados para a vida, só para o vestibular mesmo.
Antes que me acusem de ser mais uma
professora mercenária e conteudista, permitam-me defender-me: sempre estudei em
escola pública e tive a sorte de ter tido professores que resistiram a esse
discurso de negação ao vestibular e, na medida do possível, me deram condições
de entrar numa universidade pública. E sim, sinto que houve intenções e ações
efetivas que também visavam preparar-me para a vida, preocupados com minha
formação enquanto cidadã.
Não vou negar que os discursos dos
documentos que orientam a educação são bonitos
e bastante sedutores, pois falam
de formação de valores, de cidadania, de habilidades e competências que
preparam o jovem para a vida em sociedade, para o exercício pleno da cidadania.
No entanto, na prática isso tem virado desculpa para um total desprezo pelos
conteúdos escolares. A tal ponto de descaracterizar o papel da escola. Nesse
sentido, estou de acordo com o autor do artigo citado inicialmente, pois ele
afirma que “a escola que serve para tudo não serve para nada”.
A educação precisa mudar! Não acredito que
haja alguém que discorde disso. Mas essas mudanças não podem ser feitas para
apenas uma parte, a pública, no caso. Pode parecer extremismo – que seja!, mas
eu acredito que a primeira e mais profunda mudança que a educação necessita é
acabar com essa separação entre público e privado. Ou melhor, acabar com a exploração da educação pela iniciativa
privada. Depois desse primeiro passo, precisaríamos discutir as políticas
públicas educacionais com seriedade, enquanto ações públicas em vista da educação e não como politicagem, cujos interesses são bem outros que a qualidade da
educação do povo brasileiro.
Só para finalizar, não acho que o grande vilão é
o vestibular, mas sim a desigualdade de oportunidades que têm sido oferecidas
nesse sistema misto que comporta educação pública e privada com diretrizes tão
diferentes, para os jovens do ensino médio brasileiro. E não podemos tapar o
sol com a peneira, jogando toda a responsabilidade para o governo federal, sem
observar os insistentes equívocos de políticas públicas de secretarias de
educação estaduais, que gozam de autonomia suficiente para montar seus currículos
e criarem (ou não) planos de carreira para o professorado. Enfim, os problemas
são tantos quando falamos desse assunto, que me parece complicado colocar no
mesmo pacote toda sorte de responsabilidades para o fracasso da educação hoje.
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