Bacurau é visceral. Saí do cinema sem condições de
falar. E ainda estou em choque. O filme não é bom. É sensacional. Mas ao mesmo
tempo é assustador, é a coroação do fracasso civilizacional que enfrentamos,
pois ele joga na nossa cara que é a violência que dá o tom do nosso cotidiano.
Bacurau é aqui e agora. Quando a realidade se torna
distopia, a violência ficcional vira soco no estômago, porque se sabe que ela
está fora da tela, e que o sangue que escorre e o corpo que cai abatido tem
nome, sobrenome e endereço.
O filme tem uma fotografia muito bonita e uma
trilha sonora perfeita. É uma combinação de elementos que vão do realismo à
ficção científica, passando pelo suspense e pela ação, num ritmo envolvente e
com um enredo muito convincente.
A película choca, mas é mais chocante a indiferença
da população brasileira diante do enredo do cotidiano. Mais chocante que a
frieza quase sádica dos 'caçadores' de Bacurau é a perversidade e a indiferença
de políticos diante do assassinato de crianças como Ágatha Félix. Muito mais
violento do que as cenas de Bacurau, é o cotidiano de milhares de brasileiros
que vivem sob a mira de armas, numa guerra perdida e obscena que insiste em
reproduzir desculpas esfarrapadas para as mortes que causa: era bandido, era
suspeito, parecia armado, era um adolescente suspeito, estava no lugar errado,
poderia estar armado, foi um engano.
Se o filme dialoga com o hoje do Brasil, é na sua
capacidade de propor um outro modo de se viver esse hoje que encontramos sua
potência. Um povo numa vila simples onde a igreja local virou um depósito, só
pode ser uma utopia. Isso não é retrato do real vivido hoje, inchado e saturado
de igrejas, no plural, que atomizam a sociedade e vendem ilusões de salvação no
além mundo com base no discurso ilusório e cruel da meritocracia e no sucesso
pessoal medido através das doações feitas aos seus pastores sedentos por
ostentação. Um povo no qual a figura feminina, a matriarca dona Carmelita, é
quem agrega e dá o sentido de comunidade, só pode ser uma utopia, num Brasil em
que líderes religiosos insistem em dizer que mulher deve ser
governada pelo marido, o cabeça do casamento, um macho. Um lugar
marcado pela pobreza e pelo abandono da má política - simbolizada na figura
patética do prefeito local - onde a ciência é representada por duas mulheres,
Teresa e Domingas, infelizmente ainda é utopia. E basta ler os jornais e
acompanhar a decisão do CFM para entender que não se trata de realidade.
Nossa realidade é distópica, tão agudamente distópica que a ficção se torna refúgio, seja no cinema ou na literatura, no teatro ou na música. É pela arte que iremos resistir. Mas não é utopia afirmar que a resistência vem das escolas e dos museus, da história e da memória coletiva. É um convite a caminharmos lado a lado, defendendo a escola pública como espaço do conhecimento, da liberdade, da pluralidade, do questionamento genuíno e fecundo de toda narrativa que se apresente fechada e se imponha de forma autoritária.
Bacurau é arte e é também um protesto. Nem toda obra de arte tem que ser engajada politicamente. Mas Bacurau é, tem lado, acusa sem medo as perversidades e abusos do cotidiano. Não é só por isso que vale a pena assistir. Vale assistir porque é Arte! E além disso, a arte também é indústria, como faz questão de mostrar a equipe do filme no final: a produção de Bacurau gerou 800 empregos. Em tempos sombrios, de obscurantismo e negação da ciência, nos quais "os mitos" são criados para falsificar a realidade e não a fim de compreendê-la, é preciso resistir. É preciso nos unir, compartilhar, dividir, socializar sonhos, dúvidas e medos para nos fortalecer. Façamos Clubes de Leitura ou Clubes de Cinema. Adotemos uma biblioteca pública. Sejamos solidários com causas e organizações com as quais compartilhamos valores. Que a resistência que iremos fazer não precise chegar às armas. Sejamos criativos, façamos Arte!
Nossa realidade é distópica, tão agudamente distópica que a ficção se torna refúgio, seja no cinema ou na literatura, no teatro ou na música. É pela arte que iremos resistir. Mas não é utopia afirmar que a resistência vem das escolas e dos museus, da história e da memória coletiva. É um convite a caminharmos lado a lado, defendendo a escola pública como espaço do conhecimento, da liberdade, da pluralidade, do questionamento genuíno e fecundo de toda narrativa que se apresente fechada e se imponha de forma autoritária.
Bacurau é arte e é também um protesto. Nem toda obra de arte tem que ser engajada politicamente. Mas Bacurau é, tem lado, acusa sem medo as perversidades e abusos do cotidiano. Não é só por isso que vale a pena assistir. Vale assistir porque é Arte! E além disso, a arte também é indústria, como faz questão de mostrar a equipe do filme no final: a produção de Bacurau gerou 800 empregos. Em tempos sombrios, de obscurantismo e negação da ciência, nos quais "os mitos" são criados para falsificar a realidade e não a fim de compreendê-la, é preciso resistir. É preciso nos unir, compartilhar, dividir, socializar sonhos, dúvidas e medos para nos fortalecer. Façamos Clubes de Leitura ou Clubes de Cinema. Adotemos uma biblioteca pública. Sejamos solidários com causas e organizações com as quais compartilhamos valores. Que a resistência que iremos fazer não precise chegar às armas. Sejamos criativos, façamos Arte!
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