quinta-feira, 8 de maio de 2025

O povo brasileiro precisa de mais 18 deputados em Brasília?

Na última terça-feira, 06/05, a câmara dos deputados votou e aprovou o projeto de lei complementar - PLP 177/2023, de autoria da deputada Dani Cunha (União Brasil - RJ), filha do Eduardo Cunha - que altera de 513 para 531 o número de deputados federais. A votação foi uma resposta da casa após determinação do STF (Supremo Tribunal Federal) sobre o tema. A pedido do Pará, em agosto de 2023, o STF determinou a readequação do número de deputados federais por unidade federativa à população medida pelo Censo de 2022. A corte determinou ainda que o Congresso deveria editar lei sobre o tema até 30 de junho de 2025. Caso o prazo não fosse cumprido, a decisão do Supremo previa que o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) estabeleceria o número de deputados por unidade da federação até 1º de outubro de 2025 para a legislatura que se iniciará em 2027.

De acordo com a Constituição Federal, o número de deputados por estado deve ser proporcional à população, respeitando o limite mínimo de oito e o máximo de 70 por unidade da federação. O cálculo deve ser feito com base nos dados do Censo Demográfico do IBGE, atualizado a cada dez anos. No entanto, essa atualização foi feita pela última vez em 1993. 

Conforme os dados analisados pelo STF, para que a readequação do número de deputados fosse feita, sete estados perderiam cadeiras, são eles: Alagoas (1), Bahia (2), Paraíba (2), Pernambuco (1), Piauí (2), Rio de Janeiro (4) e Rio Grande do Sul (2); enquanto outros sete ganhariam: Amazonas (2), Ceará (1), Goiás (1), Minas Gerais (1), Mato Grosso (1), Pará (4) e Santa Catarina (4). Mas, como em Brasília, ninguém quer perder, todo mundo quer ganhar e a conta sempre vai parar no bolso do cidadão, com o prazo do STF vencendo, a câmara aprovou proposta para aumentar o número de deputados dos estados que hoje estariam sub-representados. De acordo com o projeto, 9 estados ganharão cadeiras na câmara federal: Pará (4), Santa Catarina (4), Amazonas (2), Mato Grosso (2), Rio Grande do Norte (2), além de Goiás, Ceará, Paraná e Minas Gerais, cada um deles com um representante a mais na Câmara.

O projeto contou com o apoio de deputados da maioria dos partidos, sendo que apenas PSOL, Cidadania, Novo e Rede orientaram voto contra a proposta. O placar final foi de de 270 votos favoráveis a 207 contra.

Conforme cálculos da própria câmara, o aumento de 18 deputados no Congresso custaria R$ 64,6 milhões por ano aos cofres públicos. Além disso, a decisão, caso confirmada pelo Senado, terá efeito cascata nas Assembleias Legislativas dos estados. Pois, de acordo com a Constituição Federal:

“O número de deputados à Assembleia Legislativa corresponderá ao triplo da representação do Estado na Câmara dos Deputados e, atingido o número de 36, será acrescido de tantos quantos forem os deputados federais acima de 12”.

Sendo assim, o estado do Amazonas que ganharia 2,  deputados federais, caso o PLP 177/2023 seja aprovado pelo senado, passaria de 24 para 30 deputados estaduais. O aumento em 18 cadeiras na Câmara não parece, a rigor, comprometido com uma melhor representação da população na Casa do Povo. O próprio critério da Constituição ao estabelecer mínimos e máximos de deputados por estado já cria possibilidades de sub e super-representação. Parece que os únicos interesses que estão bem representados nesse projeto são os dos partidos e dos próprios deputados. 

O que esperar do Senado?

Sinceramente, com Davi Alcolumbre na presidência do Senado, não espero muita coisa. Mas a reação do senador Fabiano Contarato (PT-ES) à aprovação do PLP 177/2023 é sinal de lucidez e racionalidade num ambiente que, no mais das vezes, carece dos dois. O senador disse estar “estarrecido” com o projeto e afirmou que os parlamentares deveriam ter foco no bem-estar da população e na redução das desigualdades [sociais]. 

— Isso é um escárnio com a população brasileira. Acho que o Senado precisa fazer uma reflexão e dar uma resposta. Eu defendo que o número deveria ser reduzido e que os parlamentares deveriam trabalhar mais — afirmou o senador. (fonte: Agência Senado)

Essa proposta descabida e vergonhosa merecia uma mobilização da população nas ruas. No mínimo, seria muito importante que nós, cidadãos, nos mobilizássemos nas redes, lotássemos as caixas de correio dos senadores nos posicionando Contra o PLP 177/2023. Serão mais 18 deputados para disputar o butim das emendas parlamentares. Mais 18 deputados para avançar sobre o já combalido orçamento púbico. O mesmo legislativo que cobra responsabilidade fiscal do executivo, faz a farra das emendas sem prestar nenhuma satisfação a ninguém. O poder legislativo brasileiro já está sofrendo de um inchaço que compromete o equilíbrio dos três poderes. Precisamos diminuir o número de deputados e não aumentar! 

segunda-feira, 5 de maio de 2025

Pelo direito à leitura!

Uma amiga me envia um vídeo através do qual fico sabendo que no topo dos livros mais vendidos em abril de 2025 no Brasil estão livros para colorir para adultos. Seguidos por livros de autoajuda e religiosos. Trocamos algumas mensagens de indignação. Professoras que somos, lamentamos. O que está acontecendo? Livros de colorir para adultos? Cadê os livros de literatura?

Uma notícia na Folha de São Paulo ajuda a entender o cenário: Desde 2018, quase 1/3 do Brasil tem dificuldade de entender um texto simples ou de fazer contas, diz a chamada na página principal do diário. Segundo estudo coordenado pela Ação Educativa, o Inaf (Indicador de Alfabetismo Funcional), que entrevistou 2.544 pessoas em todas as regiões do país, o Brasil estagnou na redução do analfabetismo funcional e a condição atinge 29% da população de 15 a 64 anos. Ainda segundo o estudo, a maioria dos analfabetos funcionais seriam pessoas mais velhas, 65% deles têm entre 40 e 64 anos. No entanto, há ainda uma proporção significativa entre os jovens de 15 e 29 anos e com os que têm entre 30 e 39 anos, ambos com 17%.

E a questão me parece mais grave: 17% da população que concluiu o ensino médio ainda está no nível do analfabetismo funcional; e  12%  dos que concluíram o ensino superior, ainda estão nessa condição. Esses números nos levam mais uma vez a encarar o sério problema que é a qualidade da educação em nosso país. E com o agravante da ampliação do acesso da população à internet: quanto menos alfabetizado, maior os riscos de cair em golpes, em ser enganado por desinformação.

Além do prazer que pode nos proporcionar, da possibilidade de nos humanizar através das páginas de bons livros de literatura, de ampliar nossa visão de mundo, a leitura é também uma questão de necessidade. Alguém que não é capaz de compreender um texto simples, uma notícia, um manual, não poderá exercer sua cidadania plenamente. Terá sua liberdade cerceada.

Mas sempre que o assunto é o hábito de leitura da população, nos vemos em debates pouco frutíferos. Fala-se da falta de uma cultura leitora, dos altos preços dos livros, da falta de tempo da maioria dass pessoas, tão atribuladas e esgotadas por jornadas de trabalho massacrantes (Pelo fim da escala 6x1 já!), do impacto das redes sociais... Tudo isso são pontos importantes e que merecem ser discutidos seriamente. Mas a grande questão é como formar leitores? Como estimular as crianças a iniciarem sua jornada de leitores? Como não perder esses leitores quando se tornarem adolescentes, jovens?

Imagem retirada do Pixabay.com

E parece que estamos num ciclo vicioso: penso que a formação dos pequenos leitores depende de exemplo. Portanto, de adultos leitores que possam partilhar esse hábito – melhor seria, essa paixão – com os pequenos. Se isso é difícil em casa, a escola deveria cumprir essa função. Mas quantos professores leem por prazer, por amor? Quantos têm tempo para se dedicar a leitura que não sejam aquelas obrigatórias – documentos, relatórios, e-mails, etc? 

Entender que isso também impacta na qualidade da educação e no êxito ou fracasso das nossas práticas de alfabetização pode ser um caminho para fazermos algo diferente. Políticas públicas que contemplem a formação e o cultivo de professores leitores e que estimulem as famílias e a sociedade, de maneira geral, a reconhecerem a leitura – principalmente a leitura literária – como uma necessidade e um direito de todos os seres humanos, podem nos ajudar a mudar os números tristes do estudo noticiado hoje.

quinta-feira, 2 de janeiro de 2025

Como tornar um menino um homem? Não qualquer homem, mas um bom homem

 “E eu te conheço menos, a cada dia.” Dorothea, em Mulheres do século XX, sobre seu filho adolescente, Jamie

Essa me parece uma ótima pergunta. Uma pergunta que talvez tenha sido negligenciada em décadas de feminismo. Mas, claro, falo a partir do meu umbigo, das minhas experiências e percepções, principalmente como professora em sala de aula, em contato com adolescentes. Além daquela pergunta, seria muito importante que ensinássemos os meninos a se questionarem desde cedo a respeito do que é ser um homem. Nós, mulheres, estamos lidando com esses questionamentos há alguns séculos. Talvez por isso, em Mulheres do século XX, quando sente necessidade de buscar ajuda para a tarefa de tornar seu filho adolescente, Jamie, um homem, Dorothea recorra a duas outras mulheres, mais jovens que ela, e bastante escoladas no feminismo dos anos 70.

Desde que eu era adolescente, e olha que tive uma adolescência com muitas limitações numa pequena cidade de Minas Gerais, havia uma preocupação, entre professores, principalmente professoras, em dizer para as meninas que elas poderiam fazer muitas coisas, além de casar. E desde que me mudei para Campinas, durante os anos de faculdade e depois de formada já em sala de aula como professora do ensino médio, essa fala de empoderamento das meninas se tornou muito mais forte e presente no dia a dia escolar e na sociedade de maneira geral. Disseram, e eu disse também, que as meninas poderiam ser o que elas quisessem. Mas faz alguns anos que tenho me perguntado se não falhamos em dar a mesma mensagem para os meninos.

Claro, alguém pode me dizer que os homens sempre puderam tudo. Que num mundo machista, eram as mulheres que precisavam ser estimuladas a assumirem lugares até então proibidos.  Que numa sociedade patriarcal, quem precisava ser capaz de enxergar possibilidades de ser de outras maneiras eram as meninas. Mas não seria a ideia de homem, de masculinidade, tão limitante e opressora para muitos garotos como aquele ideal de mulher o era para as garotas? Na medida em que as meninas empoderadas se tornaram mulheres empoderadas, não estaria havendo um descompasso no mundo entre homens e mulheres? Não seria esse descompasso um dos motivos de vivermos nos últimos dez anos numa sociedade invadida pelo ressentimento masculino, por ataques misóginos e crescentes taxas de feminicídios? Pelo aparecimento de grupos red pills nas profundezas e, por que não, na superfície da internet?

Revendo o excelente filme Mulheres do século XX, de Mike Mills (EUA, 2016, Netflix), me peguei pensando em como é urgente problematizarmos o lugar e a ideia de masculinidade, o que é ser homem, com nossos adolescentes. A linha mestra do filme é o diálogo. As cenas permeadas por diálogos delicados, honestos e por vezes constrangedores, explorando as fragilidades que nos fazem humanos, mostram que esse é o caminho para nos humanizar. Antes de nos tornarmos homens ou mulheres, é fundamental nos tornarmos humanos, familiarizados com tudo que é humano: dúvidas, medos, inseguranças, amor, desejos, frustrações, paixões, prazer, dor.

Onde falta o diálogo, a palavra, sobra violência, sobra o uso da força bruta. Quanto menos somos capazes de nomear o que sentimos, os bons e os maus sentimentos, menos equipados estamos para lidar com nós mesmos e com os outros. Com nossas perdas, com as emoções fortes que tendem a nos tirar do prumo, com os imprevistos, com tudo que escapa ao nosso controle. É preciso que pelo menos tenhamos a palavra, palavras, para nomear e narrar o que nos acontece e, assim, nos sentirmos um pouco que seja, confortável no mundo, confortável em nossa própria pele. Para tornar meninos bons homens – e meninas boas mulheres – é urgente que sejamos capazes de tornar crianças bons humanos adultos: sensíveis, emocionalmente confiantes, conscientes de seus limites, capazes de reconhecer nos outros a mesma humanidade que reconhece, respeita e valoriza em si mesmo, curiosos – pelo mundo e pelos humanos que habitam esse mundo -, empáticos e honestos consigo e com aqueles que estão a sua volta.

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