quarta-feira, 10 de dezembro de 2008
Função da Arte
Ferreira Gullar - folha online - 10/12/2008 - http://www1.folha.uol.com.br/folha/ilustrada/ult90u477423.shtml
quinta-feira, 4 de dezembro de 2008
Faz de conta
Fazia de conta tantas coisas.
Que até fez de conta que tinha vida: assim, viveu feliz, como se tudo aquilo fosse pra ser daquele jeitinho: Como no faz de conta...
quarta-feira, 3 de dezembro de 2008
Eu e Ele
quarta-feira, 26 de novembro de 2008
Céu aberto
sexta-feira, 21 de novembro de 2008
em busca de um deus
mas que não seja careiro,
que aceite algumas velas e incensos,
e permita que já agora seja fevereiro...
quero encontrar um deus bem corrupto,
mas que seja eficiente,
entregarei a ele óleos, moedas e enfeites,
e espero nunca mais ser carente...
quero encontrar um deus bem corrupto,
que depois de me atender, suma, desapareça.
Agora lhe serei fiel e fervorosa,
mas daqui algumas horas estarei em busca de outra crença...
quero encontrar um deus corrupto,
eficiente, que desapareça em breve e seja barateiro!
Tá, eu sei que é demais,
mas quem sabe, se ele for brasileiro...
quarta-feira, 12 de novembro de 2008
Mãos
segunda-feira, 10 de novembro de 2008
quinta-feira, 30 de outubro de 2008
Na fila do banco
A fila estava grande. O calor insuportável daquele começo de verão a obrigará colocar um vestido leve que desenhava bastante seu corpo. Os óculos escuros eram a única arma que dispunha no momento. Pelo menos sentia-se um pouco protegida daquele olhar insistente que teimava em medir-lhe cada curva e cada centímetro. O vestido florido talvez lhe concedesse menos anos do que de fato carregava. O cabelo curto poderia trazer-lhe um pouco mais de idade. Não sabia porque mas sentia-se bem ao representar-se mais velha. Pensava que alguns anos a mais poderiam lhe garantir um pouco mais de respeito e livrá-la de olhares tão agressivos como aquele que a mirava na fila...
Precisava pagar as contas de água e luz. A fila não andava. Os olhos castanhos que a obsevavam estavam em grande harmonia com aquele rosto branco, com os cabelos claros e aquela boca tão perfeitinha. O nariz era pequeno e fechava aquela aparência angelical. Não, angelical coisa nenhuma! Eram olhos endiabrados aqueles que lhe miravam. Sorriam maliciosamente e a desnudavam ali mesmo, na fila do banco. Sentia seu vestido sendo suspenso pouco a pouco e, de repente, arrancado esbaforidamente. Sentia aqueles olhos medindo cada detalhe de seu corpo. Sim, o olhar tinha mãos próprias. Mãos que à distância já acariciavam sua cintura...
Ele usava uma bermuda azul e uma camiseta branca. Usava óculos. Uma armação quadradinha de metal. Como não tinha percebido os óculos antes? Sim, de repente ele tinha novamente a carinha de anjo. De bom menino. Usava chinelos pretos e trazia uma pasta na mão direita. Que mãos bonitas ele tinha. Branquinhas. Os dedos não eram gordos nem magros. Uma mão, de fato, bonita. Tinha uma certa queda por mãos...
Será que ele percebia que ela também o observava? Não, estava protegida pelos óculos escuros. A fila andou com uma rapidez até então desconhecida naquela manhã. Outro caixa foi aberto. Mais uma senhora e seria sua vez. Estaria livre daqueles olhos, daquele olhar endiabrado.. daquelas mãos tão bonitas que podiam lhe acariciar...
Dirigiu-se ao caixa. Pagou as contas. Tão rápido. Que raiva daquela fila, quase 40 minutos. Virou-se lentamente só para certificar-se de que ele ainda estava lhe observando... Ele agora sorria, não só com os olhos, mas deixava a mostra os dentes pequenos e brancos. Os lábios separados pareciam insinuar o desejo por um beijo...
Ela caminhou firme na direção dele. Não sorria, e era difícil traduzir a expressão de seu rosto. Ele ficou nervoso, olhou atônito para os lados, e voltou a encará-la. Ela parou, abaixou-se, pegou a pasta que ele, por descuido, deixará cair. Entregou-lhe. E sem nenhuma palavra, saiu.
*****
quarta-feira, 22 de outubro de 2008
[Pequeno] Tratado sobre a alma
sexta-feira, 10 de outubro de 2008
Ausência

sexta-feira, 3 de outubro de 2008
Três e pouco da manhã
enche meus olhos de lágrimas numa repentina onda de bem querer.
Abraço-lhe também silenciosa, aspiro profundamente esse cheiro morno-laranja-avermelhado que só você tem,
e ouço uma música que fala de você e de mim,
uma música que é só minha.
Fecho os olhos e entro no escuro claro dos pensamentos que sempre trazem você para perto.
O vento lá fora faz silêncio para ouvir meu coração bater cada vez mais junto do seu.
A madrugada sorri para nós dois.
Você dorme do meu lado,
eu percorro nossos caminhos, ouço sua respiração,
e aspiro seu cheiro morno-laranja-avermelhado no silêncio escuro da madrugada que me leva por onde anda os sonhos seus.
quarta-feira, 1 de outubro de 2008
Vento ventania..
Deve estar frio. E em dias de frio, com muito vento, eu desejo entrar por debaixo da roupa dele, pra sentir o calor dele.
Estou com sono. Fui dormir tarde noite passada. E com essa ventania, eu vou é me esconder debaixo do cobertor. Eu sinto muito frio só de ouvir o barulho do vento. Estou arrepiada. Isso é engraçado...
Talvez chova novamente.. Hoje já caiu uma quantia boa de água do céu.
Nossa, eu me enganei. Já está caindo o mundo lá fora.. bom mesmo pra dormir...
terça-feira, 23 de setembro de 2008
Um pouquinho de Pessoa
Fernando Pessoa
Quando estou só reconheço
Se por momentos me esqueço
Que existo entre outros que são
Como eu sós, salvo que estão
Alheados desde o começo.
E se sinto quanto estou
Verdadeiramente só,
Sinto-me livre mas triste.
Vou livre para onde vou,
Mas onde vou nada existe.
Creio contudo que a vida
Devidamente entendida
É toda assim, toda assim.
Por isso passo por mim
Como por cousa esquecida.
sexta-feira, 19 de setembro de 2008
Sentido e sentimentos
Às vezes se sentia grande. Grande como aquelas pessoas que são altas e que chamam atenção quando passam pela rua ou grande como aquelas pessoas que, embora não tão grandonas, têm responsabilidades e um ar de gente séria.
Outras vezes sentia-se pequenininha pequenininha. Como criança de colo deve se sentir quando a colocamos bem no meio de uma cama de casal grandona. Com um mundo vasto e assustador espalhado por todos os cantos. Nessa horas queria sempre um abraço pra se esconder. Ou simplesmente chorava... Deve ser por isso que as crianças choram aquele choro doído tantas vezes...
Mas, tinha vezes que não sentia nada. Que deixava o corpo se jogar em algum lugar, na cama do beliche, ou no colchão da sala, ou no banco no circular e não pensava em nada. Ficava horas e horas viajando num vazio estranho. Em alguns momentos parecia que estava tudo cheio de palavras, e música, e medos e sonhos, e sorrisos, e fotos, e vozes, e cores e saudades. Só que essa mistura toda voltava a ser nada. Ou sempre fora nada. Ficava minutos, horas, uma eternidade num segundo. Nunca sabia direito quanto tempo tinha passado.
Sentia uma sonolência. Uma sensação de quem acorda de um sonho esquisito e esquece do enredo do sonho, permanecendo só uma sensação de que se sonhou. Os olhos ardentes lhe deixavam ainda mais confusa. Teria cochilado? dormido muito tempo? ou só dera uma piscadela? O silêncio ao redor parecia sussurrar algum segredo. Mas era segredo, e ela não podia escutar. E quantas vezes tinha se distraído por querer, só pra não ouvir o segredo. O mundo parece sentir uma coceirinha na língua. Insiste em nos dar pitadelas de segredos que se revelarão logo ali na frente. Ela desconfiava que tudo isso era feito só pra depois ele se divertir com nossa cara de espanto e alegria misturada com um pouquinho de "eu já sabia"...
Mas nesses momentos que não sentia nada, não importava se ela era grande ou pequena. Se sabia muitas coisas ou coisa nenhuma. Se era bonita ou não. Tudo tão irrelevante. A única coisa relevante nesses momentos era o nada silencioso que ocupava tudo, transformando tudo em nada. Numa confusão de tudo, onde as coisas, pessoas, vozes, músicas, sentimentos, lembranças e o futuro pareciam sair de dentro dela ou vir entrando num repente pela sua boca ou pelos seus olhos que já não podem reconhecer contorno de nada. Sim, o nada não tinha contornos. Sem limite ele vai engolindo tudo.
Sentia um calor no rosto. Sentia também um balançar esquisito, o corpo tremia de leve. Mas tudo isso foi sumindo. Ficando distante, parecia que ela se derretia ou evaporava. Um sussurro insistia em contar algo, mas ela já não ouvia, não podia ouvir. Nem falar. Era nada e tudo com o tudo que era nada. Mas foi bem nesse momento que acordou. O corpo dormente, de repente passou a formigar quase que por completo. Ela havia adormecido no banco da sala. O sol da tarde havia avermelhado seu rosto. Os livros caídos pelo chão, o rádio ligado, e o gato observando.
terça-feira, 9 de setembro de 2008
brincadeirinhas
Ele, com os olhos arregalados e um sorriso travesso no rosto soltou:
- "Cem" Fran??? Oba!
risos!!
quinta-feira, 4 de setembro de 2008
Fé e milagres
sexta-feira, 29 de agosto de 2008
Detalhes
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....algumas vezes deixo a vida/destino me levar.
nas outras, eu minto pra mim mesma que estou no controle de tudo...
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Hoje à noite a realidade estará fantasiada...
segunda-feira, 25 de agosto de 2008
O mistério dos mistérios
Os momentos de mais profunda e intensa solidão que já experimentei até hoje, foram justamente os momentos nos quais, antes de se realizarem, eu acreditava se esconder a mais completa comunhão com um outro.
Não recordo de ter sentido tanta solidão enquanto estivesse sozinha, mas sempre quando tinha alguém, muitos alguéns ou "o" alguém comigo...
Esses momentos são inicialmente de alegria, de felicidade muito grande, mas o fim deles é um vazio, uma dorzinha (no fundo da alma) e a certeza de estar só. Indiscutivelmente sozinha. Dolorosamente sozinha.
Solidão é um mistério pra mim. O mistério que parece consumir minha vida.
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Estamos sempre juntos nessa solidão!
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Agora não estou triste por isso. Mas muitas vezes já fiquei. E talvez isso ainda aconteça muitas outras vezes. Agora meus olhos estão secos, mas tem momentos em que eles choram, quando só as lágrimas parecem aliviar o nó na garganta, encher o vazio, acariciar meu rosto no escuro da noite...
segunda-feira, 4 de agosto de 2008
O estagiário
De repente se via pensando em tantas coisas novas e assustadoras. Não era só a profissão, mas a estabilidade que desejava, e os planos que talvez devesse começar a fazer: filhos,casar, comprar uma casa. Não nessa ordem, de preferência... Sentia vontade de correr, como aquela vez que havia, contra todas as recomendações da mãe, chutado bola dentro de casa e quebrado o vidro da janela da sala. Vontade de correr, pra não ter que responder nem pagar... Correr pra adiar um pouco o inadiável...
sexta-feira, 1 de agosto de 2008
Fim de tarde de inverno seco em Minas Gerais
(uns segundos depois)
-Pricisa, né?
(um tempinho depois)
-É...- um "é" espichado e depois acrescentou: a muié da televisão disse que vem chuva no saldo.
-É memo?? -com cara de desconfiado- sei não...
Enquanto isso o outro dá de ombros e faz cara de "uai".
O desconfiado continua desconfiando: - será que chóvi memo?
-Pricisa, né? a muié disse...
A cena
segunda-feira, 21 de julho de 2008
Férias
_ Fran, levanta, acabei de passar café.
Sim, voz de mãe. A geada já sumiu. São dez horas da manhã. Uma semana só, mas valeu a pena. Tirando todos os contratempos, o cartão bloqueado, a chateação de ir no banco, as pequenas desavenças familiares (implicações com a irmã, com o irmão e com a cachorra...), foi muito bom.
Mudanças aqui, e também lá. A casa dos meus pais já não é a "minha casa". Eles mudaram. Cheguei e, apesar da sensação de estar em casa, eu era uma estranha porta a dentro. Os móveis dispostos de maneira diferente. Os cômodos diferentes. Portas e janelas, a paisagem. Mas em poucas horas eu estava em casa.
E quando a gente sabe que está em casa? Comida de mãe, bronca e paparico de pai, briga com irmão, cochilo no sofá (enrolada num cobertor bem quentinho), brigadeiro feito pela irmã enquanto assiste filme de sessão da tarde, mãe trazendo xarope e dizendo "abre a boca" como se você tivesse três aninhos...
Férias, ainda que só uns diazinhos, fazem muito bem! Agora já estou de volta, e já com saudades...
quinta-feira, 10 de julho de 2008
Inesperadas
terça-feira, 24 de junho de 2008
Correr
correndo de mim,
correndo pra ti,
correndo pra mim,
correndo do tempo,
correndo pro tempo,
pra chegar à tempo,
pra fugir do vento!
correndo, sempre, mesmo quando finjo estar com tempo,
mesmo quando durmo,
corro do pesadelo que me devora,
corro pra acordar,
corro pra não parar,
e quando parar? terei corrido até o fim???
[correrei pra não perder o ônibus, agora..]
quinta-feira, 22 de maio de 2008
Loucura
Ela estava sozinha na cama. Depois de muito tempo, pelo menos pareceu muito tempo, ela esticou o braço e alcançou o celular que estava sobre o criado mudo: três e quinze da manhã.. "meu deus, isso é hora de acordar?" Fora deitar já mais de meia noite. Tinha terminado um trabalho para segunda-feira e aproveitado para organizar uma papelada que estava espalhada sobre sua mesa.
"Na verdade preciso sim, preciso do sono, de uma boa noite de sono!"
terça-feira, 13 de maio de 2008
Em busca da sabedoria
Mas o jovem tinha outros problemas com os quais ocupar sua cabeça. Questões que por vezes lhe botavam uma interrogação na testa e o faziam apertar os lábios como se sentisse alguma dor crônica. Pensando bem, talvez a aparência fosse um de seus maiores problemas sim. Ela lhe remetia sempre àquela dúvida profunda que o angustiava: o ser humano é só isso? esse amontoado de matéria que vai perecendo no tempo? Mas se não fosse, se havia algo que resistia ao tempo, o que vem a ser esse algo? Lera muitas coisas, desde tratados filosóficos e científicos, textos de teologia, literatura e poesia, até cartas de amigos, bilhetes e pequenos recados que encontrará nos livros antigos, sobre os mais variados assuntos. Em suas muitas horas de silêncio pensava e repensava sobre a sabedoria. Deseja ser sábio. Queria conhecer os homens mais sábios que estivessem sobre a terra.
Na agenda marrom, que era mais um diário do que uma agenda, e que o acompanhava em todos os lugares, e já há muitos anos, havia uma lista com nomes de pessoas que ele queria conhecer. O primeiro da lista era um intelectual muito famoso pelas coisas que escrevia. Ele viajava o mundo, e as pessoas ficavam maravilhadas quando o ouviam. Ele dava aula na universidade mais famosa da capital. Havia feito filosofia, direito, também tinha muitos conhecimentos sobre física, mas dava aula de literatura. Tinha também o nome de um senhor, já de idade muito avançada, que morava no interior do país. Era famoso por seu estilo de vida. Tinha uma esposa e cinco filhos. Morava no campo. Sua vida era simples. Mas as pessoas que conversavam com ele contavam maravilhas da sabedoria do velho. Sabedoria que não compreendiam de onde tinha saído. Ele contava 78 anos e nunca estivera numa escola. Aprendeu escrever seu nome quando já adulto. Aprendeu a ler por esse mesmo tempo. Mas desconhecia Platão, Nietzsche, Homero, Shakespeare, Camões e Machado de Assis.
Uma tarde, depois de muito tentar e esperar pelo professor, o encontrou por acaso no corredor. Não pensou duas vezes e o parou. Não sabia direito como começar a conversa. Tinha tantas coisas para perguntar. Disse uma saudação qualquer atrapalhada e se apresentou. Explicou que por muito tempo desejava encontrá-lo, e quando começaria a fazer suas perguntas, o professor impaciente olhava para o relógio e mirava o fim do corredor. Provavelmente não ouviu nada do que o jovem falava. Quando ele parou para respirar, o professor aproveitou para dizer-lhe que estava atrasado, que pegaria um voo em uma hora e ainda precisava arrumar a mala. Pediu educadamente que o jovem lhe enviasse um e-mail, ou que agendasse um horário com a secretária dele, que seria um prazer conversar com ele. Antes que o jovem pudesse dizer qualquer palavra, o professor acelerou o passo, atravessou o corredor e sumiu na frente dele...
Ele, que na sua busca por sabedoria aos poucos já tornava-se sábio sem o saber, riscou o nome do professor da agenda marrom. Não poderia haver sabedoria numa pessoa de tais modos. Ele sequer sabia ouvir. Um sábio minimamente sabe ouvir aqueles que dele se aproximam. Sabem reconhecer em tudo o que acontece na vida um ensinamento novo. Agora iria procurar o velho.
Série: Um gato em minha vida I
Fixou os olhos no chão como se procurasse algo. Mas a busca cessou. Fechou os olhos. Parecia tirar um cochilo, ali, sentado, no meio da sala. A orelha movimentou-se discretamente. A cabeça pendeu para o lado, como quem dá um "pescada". Abriu os olhos rápido e espiou ao redor como se preocupado com algum observador atento... Pareceu não me ver ou pouca importância deu a minha presença. Tornou a fechar os olhos. Abaixou a cabeça encostando-a no peito. É, parecia consumido pelo sono. No entanto, havia dormido o dia todo...
Levantou-se num salto. Deu alguns passos em circulo e retornou a posição anterior, novamente contemplando a imagem que se estendia a sua frente...
Meus deus, esse gato anda muito narcisista!! Imagina só se gostasse de água...
segunda-feira, 5 de maio de 2008
Fragmentos
segunda-feira, 28 de abril de 2008
Virada
sexta-feira, 4 de abril de 2008
[sem título]
às vezes calor,
outras vezes não sei quem sou...
às vezes assisto tv,
às vezes compro sorvete,
outras vezes tenho medo...
às vezes ando sozinha pela rua,
às vezes canto no chuveiro, nua,
outras vezes não sei, sumo...
Tem dias que o sol me deixa feliz,
tem outros que tenho vontade de chorar,
com sol, com chuva ou por qualquer coisa..
Tem dias que sinto muita fome,
como fruta, comida, chocolate,
tem dias que sinto sono... e mais nada...
às vezes sou de lua,
tenho fases e tudo,
outras sou simples, mas ninguém me entende...
então, às vezes, em alguns dias,
eu me escondo, eu finjo,
sei lá, e aí acreditam que sou "eu"!
domingo, 9 de março de 2008
Mudanças

Era nas renuncias que pensava agora. Renunciaria um lugar que fizera parte desses últimos 4 anos de sua vida. Renunciaria ao lugar que aprendera a chamar de casa. Sua casa. Mas no fundo não era grande coisa isso! era só uma casa. As lembranças, cada detalhe de tudo que havia passado, estaria com ela onde estivesse. Bom que as lembranças não tão boas assim poderiam ser deixadas para trás...
Mudanças fazem bem! Não estava tentando se convencer disso. Realmente pensava assim. Acreditava que estava passando por um momento importante de crescimento, de descobertas, e de renovação. Por que não? Mudar de ares era uma questão de se permitir olhar para outros horizontes... era uma chance de se olhar diferente também.
Mas mesmo com tudo isso, não deixava de sentir medo... Adaptar-se novamente. Ter um outro teto pra chamar de seu. Seria por pouco tempo também. Provavelmente mais mudanças virão no próximo ano... Estava segura do que faria. E depois, talvez o que mais assustasse no momento fosse o gatinho...Mas tem cabimento? medo de um pobre gatinho? iria, sim, se acostumar com ele. É dócil e muito bonitinho. E é só um gato...um gato não pode ser mais difícil do que gente... Gente sim é um bicho esquisito. Arredio, às vezes. Desconfiado, cruel, mau.. os gatinhos não..
Mas era difícil controlar a ansiedade. São 4 anos. E agora talvez se sentisse como quando deixou a casa dos pais. Naquele tempo, a casa dos pais era a sua casa. Agora a casa que deixará é a sua casa. Mas também já se acostumou (ou, pelo menos, pensava ter se acostumado) com essa ideia de ter casa nenhuma. Posses são sempre ilusões... usamos um pronome possessivo e pronto! achamos mesmo que possuímos algo... ou alguém...
Mas vai dar tudo certo... Mudanças são boas!!
segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008
Passeio de sábado

Foi na sala de literatura e poesia brasileira que nos perdemos mesmo. Uma lembrança, uma promessa de leitura, uma troca de impressões - Capitu traiu ou não Bentinho? Um soneto de Camões, uma poesia de Pessoa, um conto da Clarice. Livros com cheiro de saudade. "Esse eu li no colégio!" "Eu também." "E esse aqui, você já leu?" "Não, esse não." "Mas esse eu li!" "Ah, esse eu não li não.."
Sebo é um lugar fantástico. É um dos meus lugares favoritos! Bom, às vezes, me divirto bastante também numa livraria. Mas os livros velhos, que trazem histórias em suas páginas amareladas, dedicatórias e alguns marca-páginas são muito mais interessantes. Muitas vezes fico viajando, pensando nas pessoas que possuíram aqueles exemplares. Nas histórias de suas vidas. Eu gosto de escrever nos livros. Nos meus, e nos que faço presente para amigos. Colocar nome, data e local onde comprei. Sei lá, um dia alguém poderá ter os meus livros em mãos e ter o mesmo prazer que tenho em ficar imaginando quem seria Francine, e o que teria sentido naquele dia em que comprou ou ganhou aquele livro, onde estaria. Nos livros que comprei, só no "Tempus Fugit" do Rubem Alves tem uma assinatura e uma data, no entanto, não fui capaz de decifrar o nome, nem mesmo de compreender a data, é uns vinte e pouco de junho de noventa e alguma coisa... Eu comprei três livros do Kundera: "A insustentável leveza do ser", " A brincadeira" e "Risíveis Amores". Esse último eu comecei a ler ontem. Também trouxe pra casa um dos Pensadores, do Wittigeinstein. Livro que esteve na minha cara e não pude ver... tem horas que tudo que precisamos em nossas vidas é um olhar estranho, que chega assim, pára do seu lado, e te mostra o que estava, literalmente, na sua cara...
Ele também comprou um livro do Rubem Alves; Também trouxe pra casa o "Viva o povo brasileiro", quero ver quando vai ler esse tijolinho, como ele mesmo classificou o grosso livro de capa dura vermelha. Nossa, não me recordo quais foram os outros dois livros que ele comprou. Tinha alguns em suas mãos, e quando fomos convidados a nos retirar, porque já era meio dia e estavam fechando o Sebo, ele separou rapidamente os que compraria. Fiz o mesmo. Também tinha separado mais livros do que de fato eu trouxe. Mas, além do fato de não querer gastar muito de uma vez só, temos a desculpa de fazer esse passeio mais vezes...
Saindo do Sebo D'Agosto, ficamos caminhando, um pouco sem rumo, pelo centro de Campinas. Eu tinha listinhas de outros Sebos, que aquela hora provalmente já estariam fechados, caso eles existissem de fatos! É, chegamos em dois endereços e.. Cadê o número que deveria ser um Sebo? Não existia! Mas foi divertido. Numa dessas procuras em vão, descobrimos o MIS - Museu de Imagem e Som. Entramos. Foi bem divertido. Tinha uma exposição sobre Biotecnologia e a exposição fixa do museu. Nossa, descobrimos que estamos ficando velhos. Os aparelhos de TV que fizeram parte de nossas infâncias já viraram peça de museu...Também as câmeras filmadoras, dos casamentos e festa de aniversários de tios e primos, já estão lá...
Depois do MIS, fomos até o Mercado Municipal. Meu deus, eu "so" boba mesmo, adorei o mercado! Comemos uma pamonha muito gostosa lá. A princípio tive medo de experimentar. Sei lá, às vezes sou muito fresca com alimentação. Mas estava uma delícia, quentinha e muito saborosa. O preço das coisas é uma ótima justificativa para voltarmos lá outros sábados...
Bom, demoramos mais do que havíamos planejado. No fim das contas estávamos os dois com os pés cansados. Mas acho que a mesma carinha de feliz que ele tinha era a minha. Rimos bastante caminhando pelas ruas.
Em meio a um monte de gente estranha, eram só mais duas pessoas passando pelas ruas de Campinas. Duas pessoas que não tinham pressa, que tinham todas as horas daquele sábado de fevereiro, sem sol nem chuva, para passarem um do lado do outro. Rindo das mais insignificantes coisinhas: por terem tomado a rua na direção errada, e foi duas vezes que fizeram isso; por chegarem no lugar onde deveria ter um Sebo e sequer achar o número que estava anotado na listinha... Que sorriam um para o outro com graça e felicidade. Se misturavam entre as muitas pessoas que iam e vinham pelas ruas sob aquele céu cinzento no centro da cidade. No fim, a promessa de que fariam aquele passeio mais vezes, porque tinham muitas coisas para conhecer ainda...
quinta-feira, 21 de fevereiro de 2008
Prece

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008
Filme
segunda-feira, 18 de fevereiro de 2008
A colheita
A marcha era silenciosa. Mas era ritmada: todos andavam na mesma direção como se estivessem em fila. Os pés se levantavam juntos e tocavam as areias também juntos. Nas mãos, elas seguravam fios coloridos embolotados. Eles traziam um pedaço de madeira. Os pequenos não acompanhavam aquela caminhada. O chá azul que eles tomaram na noite anterior os faria dormir até que a colheita terminasse.
No primeiro dia da colheita, Zubuiê chegaria antes e se recolheria mais tarde. Taioá, irmã de Zubuiê, ficava escondida por esse tempo. Assim eles descansavam profundamente durante a noite escura, para que a colheita rendesse.
O Templo estava iluminado. Os guardiões preparavam tudo. No centro estava o lugar do grande sacrifício. Durante a colheita seria separado tudo que ficará ali e, no último dia, será entregue à Kaiemá. As portas do Templo se fechariam e Kaiemá só voltaria na próxima colheita. As folhas sagradas queimavam em todos os cantos do Templo. Os mantos escuros já estavam no chão. O colorido dos tecidos e das tintas se misturavam com os raios de Zubuiê que entravam pelos quatro símbolos no teto. A fumaça aos poucos trazia ao centro do Templo os primeiros sinais de Kaiemá. Elas começaram a dança. Eles faziam a batida ritmada. Dois grandes círculos, girando em sentidos invertidos, se organizaram no interior do Templo. De repente, param e formam a estrela de cinco pontas.
Kaiemá surge no centro das estrela e seu brilho intenso deixa todos embriagados. Ela se curva em direção aos quatro cantos do Templo. Sopra a fumaça das folhas sagradas e a alma deles inspira. Seus corpos vazios caem no chão. Kaiemá passeia por entre os corpos caídos, e deixa sobre cada um uma nova semente. Antes de sair do Templo ela devolve as almas a seus corpos, num expiro longo.
Quando eles acordam ficam extasiados com as novas sementes. As folhas sagradas foram todas queimadas. As cinzas são recolhidas no centro, onde serão feitas as oferendas. Ao redor do Templo começa a dança da colheita. Quando Taioá chega eles dormem. Durante a noite Taioá desaparece. No meio da noite escura, Kaiemá volta para trazer o alimento e a bebida para o dia seguinte. Os primeiros raios de Zubuiê os faz despertar. Maravilhados, devoram tudo que Kaiemá trouxe durante o sono. Novamente entram no Templo, mais uma vez dançam até Kaiemá aparecer. Outras sementes foram deixadas pela deusa. Dessa vez, a irmã mais nova de Kaiemá vinha molhar a terra e deixava um perfume inebriante no ar. Kuraiá só voltaria quando a colheita tivesse chegado ao fim. Mais uma vez descansavam quando Taioá regressou. Como na noite anterior, Taioá desaparece durante a noite e Kaiemá vem trazer o alimento.
Quando Zubuiê vem despertá-los, devoram todo alimento e logo em seguida iniciam a marcha até a plantação. Voltariam ao Templo no fim do dia para entregar à Kaiemá o que lhe pertencia. Voltavam no mesmo ritmo silencioso. Os pequenos em breve estariam despertos. Os guardiões enviados por Kaiemá regressavam para o Templo. As portas seriam fechadas e as oferendas fariam Kaiemá descansar até a próxima marcha.
O trabalho agora era cuidar das novas sementes até a nova colheita...
08/10/2007
quinta-feira, 14 de fevereiro de 2008
Cinema
Estava com alguns amigos que assistiriam outro filme. Ele liga, 18:14. Mas a ligação cai. Ela liga e dá caixa postal. Será que aconteceu alguma coisa? Não vai chegar em tempo? Mas fica tranquila. Não, ele só queria dizer que já está chegando. Continua conversando com os amigos. O telefone toca novamente, 18:18, é ele. "Estou no ônibus, daqui a pouco chego aí". Certo. Os amigos vão comer antes do filme. Encontra mais pessoas conhecidas. E a hora vai passando...18:36, o filme começará as 18:40. Ele não chega. Ela resolve ligar. "Já estou no shopping"! Ele deve tá correndo.. E estava! De repente ela vê um mocinho de camiseta amarela correndo pela praça de alimentação... Ia passando por ela desapercebidamente... Ela o chama. Um abraço. Que gostoso! Que abraço bom. Ficaria todo o dia assim, junto desse abraço. Ele estava todo atrapalhado. Tinha corrido bastante. Mas estavam em tempo. No fim das contas o filme começou com atraso de uns dez minutos.
O filme? Legal! Mas bom mesmo foi ficar abraçadinha com ele, sentindo o toque de suas mãos, carinho no braço, sentindo a respiração...
Ela não gosta de shopping. Aquele povo se esbarrando. Todos tão parecidos. Meninas iguais em fila, como se fossem bonecas na esteira de uma fábrica...o mesmo pode ser dito dos meninos, em suas bermudas caidas, com seus topetes...
Mas dessa vez foi diferente. Nem teve tempo para se irritar com nada disso. Jantaram no shopping. Conversaram, riram.. se olhavam com aquele olhar bobo... troca de confidêcias silenciosas, nos olhares sorrindo: como você me tem feito feliz, ela pensava.
Voltaram para casa abraçadinhos no circular. Ele contava como tinha sido seu dia. Talvez viajasse na próxima semana. Ela gosta de ouvir a voz dele. E o jeito que ele se empolga com as coisas que faz. Ele tem muita energia. Caminharam até a casa dela. Já estava tarde e ele preferiu não entrar. Mas que dificuldade deixar ele ir... Se pudesse, se tivesse uma varinha mágica, pra congelar o tempo, ou pra diminuir as horas que marcavam o relógio do celular... Parecia um imã. Mas que bobeira! Ele só vai pra casa. E amanhã com certeza se verão novamente. Mas era como se qualquer tempo que passassem longe pudesse roubar deles um bocado de felicidade...
Com muito custo se soltaram. Ele desceu a rua, ela se colocou portão a dentro... Andava sorrindo... já imaginava que horas se encontrariam no dia seguinte.. Esperava que esse sentimento bom durasse muito tempo..
segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008
Mais um retirado do fundo do baú..
A vida é pura melodia...
Uma sinfonia,
Uma grande ópera,
A vida é música...
Ouço a música dos pássaros,
Que são livres, desconhecendo qualquer conceito de liberdade...
Ouço a música dos que vêm e vão,
Apressados, atrasados,
Felizes, agitados...
Eu também sou música:
Uma velha canção que agora está em novo rítmo...
Sou música que acalma,
que atrai,
que desperta desejos.
Música que quer ser tocada,
Cantada, ouvida...
Sou música:
Agora uma nova melodia...
breve ou eterna,
Dependendo de quem vai me ouvir...
Ouço a música dos que não me ouvem.
A música dos que sequer sabem que são melodias...
Música,
Quanta beleza se esconde nas notas,
Quanto sentimento,
Quanto mistério,
Quantas lembranças...
Sou música que encanta,
Que faz chorar.
Sou música das horas de solidão,
Que quebra o silêncio e
Que abafa o som das lágrimas que caem...
Sou música,
Somos todos uma canção!
Agora sou música
Que faz dançar,
Que faz sorrir,
Que faz cantar...
A vida:
é uma melodia...
Uma sinfonia,
Uma grande ópera,
A vida é música...
10/09/2004 / Coqueiros da Unicamp
sexta-feira, 1 de fevereiro de 2008
Mais Rilke!
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Roma, 23 de dezembro de 1903
Meu caro Sr. Kappus,
Não quero que fique sem uma saudação minha pelo Natal, quando, no meio da festa, carregar a sua solidão mais dificilmente do que nunca. Mas se verificar, nesse momento, que a sua solidão é grande, alegre-se com isto. Que seria, com efeito, uma solidão (faça esta pergunta a si mesmo) que não tivesse grandeza? Há uma solidão só: é grande e difícil de se carregar. Quase todos, em certas horas, gostariam de trocá-la por uma comunhão qualquer, por mais banal e barata que fosse; por uma aparência de acordo insignifiante com quem quer que seja; com a pessoa mais indigna. Mas talvez sejam estas, justamente, as horas em que ela cresce, pois o seu crescimento é doloroso como o de um menino e triste como o começo das primaveras. Mas tudo isto não o deve desorientar. O que se torna preciso, é no entanto isto: solidão, uma grande solidão interior. Entrar em si mesmo, não encontrar ninguém durante horas - eis o que se deve saber alcançar. Estar sozinho como se estava quando criança, enquanto os adultos iam e vinham, ligados a coisas que pareciam importantes e grandes porque esses adultos tinham um ar tão ocupado e porque nada se entendia de suas ações.
Se depois um dia a gente descobre que suas ocupações são mesquinhas e suas profissões petrificadas, sem ligação alguma com a vida, por que não voltar a olhá-los outra vez como uma criança olha para uma coisa estranha, do âmago de seu próprio mundo, dos longes de sua própria solidão que é, por si só, trabalho, dignidade e profissão? Por que querer trocar a sábia não-compreensão de uma criança pela defensiva e pelo desprezo, - uma vez que a não-compreensão significa solidão, ao passo que defensiva e desprezo equivalem à participação nas próprias coisas cujo afastamento se deseja?
Pense, caro senhor, no mundo que leva em si e chame o seu pensamento como quiser: resminiscência da sua própria infância ou saudade do futuro - o que importa apenas, é prestar atenção ao que nasce dentro de si e colocá-lo acima de tudo o que observar em redor. Os seus acontecimentos interiores merecem todo o seu amor; neles de certa maneira deve trabalhar e não perder demasiado tempo e coragem em esclarecer suas relações com os homens. Aliás, quem lhe diz que as tem? Sua profissão, bem o sei, é dura, cheia de contradições para si; previ a sua queixa e sabia que ela havia de vir. Agora que chegou não o posso tranquilizar, mas apenas aconselhar-lhe que examine se todas as profissões não são assim cheias de exigências, de hostilidade contra o indivíduo, como que ensopadas do ódio daqueles que, mudos, resmungando, se tiveram de conformar com o simples dever. A posição em que agora deve viver não é mais carregada de convenções, preconceitos e erros do que todas as outras. Se há algumas que exigem bem uma liberdade maior, não existe nenhuma que seja larga e ampla em si, relacionada com as grandes coisas de que se compõe a verdadeira vida. Mas o solitário é como uma coisa submetida
às profundas leis. Ao sair para a manhã que aponta, ao olhar para a noite cheia de eventos, se chega a sentir tudo o que aí acontece, todos os encargos se desprenderão dele como de um morto, embora se encontre no meio vibrante da vida. O que agora deve experimentar, caro Sr. Kappus, em sua qualidade de oficial, tê-lo-ia sentido em qualquer das profissões existentes. Mesmo que, fora de qualquer posto, tivesse procurado apenas contatos leves e independentes com a sociedade, este sentimento constrangedor não lhe seria poupado. - Por toda parte as coisas são assim. Mas isto não é um motivo de angústia ou tristeza. Não tendo nenhuma comunhão com os homens, procure ficar perto das coisas, que não o abandonarão. Ainda há as noites e os ventos que passam pela árvores e percorrem muitos países. No mundo das coisas e dos bicho tudo está ainda cheio de acontecimentos de que o senhor pode participar. As crianças são ainda como o senhor era quando criança, tão tristes e tão felizes - e quando pensar na sua infância, torne a viver entre elas, as crianças solitárias: os adultos voltarão a não ser nada, e suas dignidades não terão nenhum valor.
Se porventura lhe for temível e penoso pensar na sua infância, na simplicidade e no silêncio ligados a ela, por não poder mais crer em Deus que nela se encontra por toda a parte, então pergunte a si mesmo, caro Sr. Kappus, se relamente terá perdido a Deus. Não será, antes, que o senhor ainda não o possuiu? Aliás, quando o teria possuido? Parece-lhe que alguém que realmente o possui o possa perder como um seixo? Não lhe parece, antes, que aquele que o teve pode por Ele ser perdido? Se porém, reconhece que Ele não existia na sua infância, nem antes; se admite que Cristo foi iludido pela sua saudade e Maomé enganado por seu orgulho; se percebe com espanto que Ele não existe nem mesmo nesta hora em que falamos d'Ele - que coisa então o autoriza a sentir a falta de alguém que nunca foi e a procurá-lo como se estivesse perdido?
Por que não pensar que Ele é o vindouro, aquele que está por vir desde a eternidade, o futuro, o fruto final da árvore de que nós somos as folhas? Que é que o impede de projetar o seu nascimento para os tempos posteriores e viver a sua vida como um dia belo e doloroso de uma grandiosa gravidez? Não vê como tudo o que acontece é sempre um começo? Não poderia ser, então, o começo d'Ele, pois todo começo em si é tão belo? Se Ele é o mais perfeito, não deve ter havido algo menor antes d'Ele para que Ele se pudesse escolher a si mesmo dentro da plenitude e abundância?Não deverá ser Ele o último, para encerrar tudo em si? Que sentido teria a nossa vida se Aquele a que aspiramos já tivesse sido? Como as abelhas reúnem o mel, assim nós tiramos o que há de mais doce em tudo para o construirmos. Começamos pelo pormenor, pelo insignificante (posto que venha do amor), depois pelo trabalho e pelo repouso, por um silêncio ou por uma pequena alegria solitária; por tudo o que fazemos, sem participantes ou aderentes, iniciamos Esse que não podemos compreender, do mesmo modo que os nossos antepassados não nos puderam compreender a nós mesmos. No entanto, estes seres desaparecidos há muito, estão em nós, em nossos pendores, pesando sobre nosso destino, zumbindo em nosso sangue, emergindo num gesto que sobe do âmago dos tempos.
Existe algo que lhe possa tirar a esperança de estar futuramente n'Ele, no longínquo, no extremo?
Festeje o Natal, caro Sr. Kappus, com o pio sentimento de que talvez Ele, para começar, aguarde do senhor justamente esta angústia de viver. Talvez justamente estes dias de transição sejam o tempo em que tudo o no senhor trabalha n'Ele, como outrora, quando criança o senhor n'Ele trabalhou palpitante. Não seja impaciente e mal-humorado. Lembre-se de que a menor coisa que podemos fazer consiste em lhe dificultar tão pouco o nascimento quanto a terra dificulta o advento da primavera, quando ela tem de vir.
Fique alegre e tranquilo.
Seu
Rainer Maria Rilke
Retirada de Cartas a um jovem poeta, de Rainer Maria Rilke
quarta-feira, 30 de janeiro de 2008
Amigo é coisa pra se guardar...
Minha memória não é lá aquelas coisas, mas me lembro de pequenos detalhes de nossa infância. Ele tinha os olhos bem arregalados, e ainda os tem quando está preocupado ou assustado..., uma vez derrubei um estojo dele no chão. E voou pedacinhos para todos os lados daquela primeira sala do prédio da escola estadual Marquês de Sapucaí... Tínhamos sete anos. Primeira série. Choramos juntos: ele pelo estojo em pedaços, eu por vê-lo chorar, talvez, não posso lembrar ao certo...
Quando chegava época de festa junina, todas as menininhas queriam dançar quadrilha com ele. Só porque ele era o mais bonitinho.... Eu nunca dancei quadrilha com ele. Ah, não na escola, porque depois de grande, uma vez dançamos quadrilha na festa junina do Canto Caipira...Me lembro da tal dança do pulinho, acho que nós dois mais riamos do que pulávamos...
Nossa, nós brigamos tanto e tantas vezes e por tantas coisas... Tínhamos, e ainda temos muitas vezes, opiniões invertidas... Mas o meu amigo sempre foi um homem de ciência. Acho isso muito legal. Desde pequeno, ele adorava todas aquelas coleções, de chocolate, de chiclet, do que fosse, sobre dinossauros, sobre a origem do mundo, os peixes... Ele sempre sabia tudo, aqueles nomes científicos estranhos... Eu sempre fui mais borboleta... Gostava mesmo era de literatura e poesia. Mas ele também gostava disso. Gostava de ler minhas agendas e descobrir meus versos perdidos entre uma música e outra...
Ele já teve ciúmes de mim e eu ainda tenho dele... Durante os últimos anos do ensino médio, nos tornamos inseparáveis. Ele entrou na faculdade antes de mim. Mas sempre que voltava durante o primeiro ano de faculdade, dizia que estava me esperando. E foi ele que me incentivou muito a estudar e prestar vestibular. Apesar que, no dia em que fui prestar vestibular, esse meu amigo que apronta umas que só ele consegue, me levou para a casa dele, mas não levou a chave da casa. Era período de férias, e eu então tive que pular um muro para poder entrar na casa dele...
Quando fui morar longe de casa, o que me acalmava era saber que meu irmão estaria lá. E esteve. Ele é muito querido. É engraçado, atrapalhado, muito inteligente, tem as manias dele, mas quem não tem... Conheci muita gente legal por causa dele. Fiz amizades preciosas na faculdade. Pessoas que abriram um espacinho em suas vidas para mim porque eu era "a amiga do Mineiro".
Tem muitas lembranças e muito presente que nos une, e espero que muito futuro também...
Esse meu amigo querido, o Fael, o Mineiro, o Rafa, o Rafinha, tem um papel fundamental na minha vida. Aprendi muitas coisas com ele. É um desses amores eternos que a gente tem na vida, e que nem foi porque escolheu... foi presente mesmo!!!!
Feliz aniversário meu querido amigo!!! Te amo muito!
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